É a mim, Leonor Moreira, que a janelinha conta a história!
A história de uma vida muito quentinha, cheia de brilhos, apesar de tantos e rigorosos Invernos de preocupações e duros trabalhos, na companhia de seu marido, que cedo partiu, e depois dos seus ternurentos filhos e netos, num percurso de cem lindas primaveras bem contadinhas.
A Sra Bia!
É aqui - diz-me a janelinha - que, inclinada e segurando com seus braços a bonita colcha, ela vê as procissões da Sra Da Azinheira ( Outeiro Seco) e do Padroeiro São Miguel e tudo o que por ali circula, não fosse esta a Rua Principal .
Os sons já fogem da sua capacidade auditiva. Também que importância terá para a Sra Bia ouvir o sino ali ao lado, martelar no seu ouvido, ou as conversas circunstanciais dos que passam, se a sua história é outra, tão rica de memórias e vivências saborosas, ao longo de um tempo que foi outro, um mundo de solidariedade e partilha, lealdade e incondicional amizade com todos, resignação e muito trabalho ... enfim, uma vida que só a ela pertence, com todos os seus segredos de longevidade.
Aconchegando os seus braços neste privilegiado cantinho do seu lar, padieira em U invertido, que lhe serve de moldura, a senhora Bia leva o olhar para um futuro longo, outrora desembaraçados pelo peso do trabalho diário, tanto como a mente, consumida pelo aparecer do necessário para o sustento dos seus filhos e, prazenteira, hoje e sempre, mostra seu genuíno sorriso aos passantes.
Uma certeza temos: é daqui que ela oferece a sua beleza calma e singela, de pessoa que cumpriu as tarefas, sem manifestar cansaço pelos anos vividos, sem um queixume sequer.
Há tempos, olhando o céu, parecia ter saudades do seu par, que há muitos anos a deixara com o peso das responsabilidades todas, no criar e desaninhar dos seus filhos, mas ao certo, não o sabemos.
Tarefa difícil nos dias de hoje, sendo um exemplo para nós, que, aves de aviário, estamos prontos a cair ao primeiro abanão de uma árvore mal ancorada no Outono da vida.
Nessa altura, passava em frenética pressa - conta-nos a janelinha - ali dentro da cozinha, escadas abaixo, ainda o sol sonhava deitado no travasseiro dourado, a encher os cântaros do precioso leite que o burro transportava diariamente para a cidade.
E eu, esta janelinha, pensava: - Oh! Logo voltará p'ra lavar os cântaros ali no nosso rio.
Mas eu espreitava, assim de lado, e lá ia ela mais a burra e os cântaros e ainda uma garota, que se agarrava â cilha do animal. Vivia no Penedo e era amiga da nossa personagem, onde todas as manhãs ia pelo quartilho de leite, antes da sua viagem p'ro Liceu da cidade.
Hoje, após a simplicidade e leveza das suas tarefas diárias, presenteia todos os que por aqui passam com a sua beleza natural de gente de bem, pousando-se aqui para ver a paisagem possível neste retalho de céu, como a dizer: - Olá! Estou aqui! Estou bem!
Adorava sair daqui e vê-la da rua ... há-de ficar bonita nos retratos!
Leonor Moreira
in "Tantos dias têm 100 anos! Homenagens e afectos, no centenário da Tia Bia e da Tia Amélia"
- publicação de Altino Rio
Foi com grande prazer que reli este texto, porque me traz reminiscências de um passado longínquo, mas ainda presente. Parabéns e cumprimentos,
ResponderEliminarNuno Santos
Muitos parabéns amiga!Adorei.
ResponderEliminarLurdes
Linda, esta amiga de sempre!
ResponderEliminarO livro, está encantador, com fantásticas fotografias.
Foi pra mim uma honra, estar presente nesta homenagem.
Beijinho com saudade da SrªBia.
Lidia Moreiras
Só uma grande amiga como tu, para escrever este lindo texto de homenagem. Tal como diz o Nuno, foi um prazer lê-lo de novo.
ResponderEliminarParabéns e um beijinho.
Albertina
Beijinho para ti tb, amiga Albertina.
ResponderEliminarleonor
Este segundo "remake" fez-me recuar uns bons anos até à minha adolescência. Parabéns, amiga Leonor, por esta pérola que nos legáste.
ResponderEliminarUm abraço de amizade.
Jorge Bilela.
Um abraço p'ra ti, amigo Jorge!
ResponderEliminarleonor