quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Aquela linda janelinha!

É a mim, Leonor Moreira, que a janelinha conta a história!
A história de uma vida muito quentinha, cheia de brilhos, apesar de tantos e rigorosos Invernos de preocupações e duros trabalhos, na companhia de seu marido, que cedo partiu, e depois dos seus ternurentos filhos e netos, num percurso de cem lindas primaveras bem contadinhas.

A Sra Bia!
É aqui - diz-me a janelinha - que, inclinada e segurando com seus braços a bonita colcha, ela vê as procissões da Sra Da Azinheira ( Outeiro Seco) e do Padroeiro São Miguel e tudo o que por ali circula, não fosse esta a Rua Principal .
Os sons já fogem da sua capacidade auditiva. Também que importância terá para a Sra Bia ouvir o sino ali ao lado, martelar no seu ouvido, ou as conversas circunstanciais dos que passam, se a sua história é outra, tão rica de memórias e vivências saborosas, ao longo de um tempo que foi outro, um mundo de solidariedade e partilha, lealdade e incondicional amizade com todos, resignação e muito trabalho ... enfim, uma vida que só a ela pertence, com todos os seus segredos de longevidade.
Aconchegando os seus braços neste privilegiado cantinho do seu lar, padieira em U invertido, que lhe serve de moldura, a senhora Bia leva o olhar para um futuro longo, outrora desembaraçados pelo peso do trabalho diário, tanto como a mente, consumida pelo aparecer do necessário para o sustento dos seus filhos e, prazenteira, hoje e sempre, mostra seu genuíno sorriso aos passantes.
Uma certeza temos: é daqui que ela oferece a sua beleza calma e singela, de pessoa que cumpriu as tarefas, sem manifestar cansaço pelos anos vividos, sem um queixume sequer.
Há tempos, olhando o céu, parecia ter saudades do seu par, que há muitos anos a deixara com o peso das responsabilidades todas, no criar e desaninhar dos seus filhos, mas ao certo, não o sabemos.
Tarefa difícil nos dias de hoje, sendo um exemplo para nós, que, aves de aviário, estamos prontos a cair ao primeiro abanão de uma árvore mal ancorada no Outono da vida.
Nessa altura, passava em frenética pressa - conta-nos a janelinha - ali dentro da cozinha, escadas abaixo, ainda o sol sonhava deitado no travasseiro dourado, a encher os cântaros do precioso leite que o burro  transportava diariamente para a cidade.
E eu, esta janelinha, pensava: - Oh! Logo voltará p'ra lavar os cântaros ali no nosso rio.
Mas eu espreitava, assim de lado, e lá ia ela mais a burra e os cântaros e ainda uma garota, que se agarrava â cilha do animal. Vivia no Penedo e era amiga da nossa personagem, onde todas as manhãs ia pelo quartilho de leite, antes da sua viagem p'ro Liceu da cidade.
Hoje, após a simplicidade e leveza das suas tarefas diárias, presenteia todos os que por aqui passam com a sua beleza natural de gente de bem, pousando-se aqui para ver a paisagem possível neste retalho de céu, como a dizer: - Olá! Estou aqui! Estou bem!
Adorava sair daqui e vê-la da rua ... há-de ficar bonita nos retratos!
Leonor Moreira
in "Tantos dias têm 100 anos! Homenagens e afectos, no centenário da Tia Bia e da Tia Amélia"
 - publicação de Altino Rio

7 comentários:

  1. Foi com grande prazer que reli este texto, porque me traz reminiscências de um passado longínquo, mas ainda presente. Parabéns e cumprimentos,
    Nuno Santos

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  2. Muitos parabéns amiga!Adorei.

    Lurdes

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  3. Linda, esta amiga de sempre!
    O livro, está encantador, com fantásticas fotografias.
    Foi pra mim uma honra, estar presente nesta homenagem.
    Beijinho com saudade da SrªBia.
    Lidia Moreiras

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  4. Só uma grande amiga como tu, para escrever este lindo texto de homenagem. Tal como diz o Nuno, foi um prazer lê-lo de novo.
    Parabéns e um beijinho.
    Albertina

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  5. Este segundo "remake" fez-me recuar uns bons anos até à minha adolescência. Parabéns, amiga Leonor, por esta pérola que nos legáste.
    Um abraço de amizade.
    Jorge Bilela.

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